Comissão Mista discutiu alterações na concessão do seguro-desemprego
CUT, UGT, CSB, Contag, NCST, um juiz do Trabalho e até o relator, o senador petista Paulo Rocha, criticaram as MPs que mexem com direitos trabalhistas.
Representantes de centrais sindicais criticaram o governo, nesta terça-feira (7), por não ter negociado o texto da Medida Provisória 665/14 antes de enviá-la ao Congresso Nacional. A MP foi debatida em audiência pública da comissão mista de deputados e senadores que analisa o texto.
A MP alterou as regras do seguro-desemprego, ampliando o tempo de contribuição para o primeiro acesso (de seis para 18 meses), e do abono salarial. Ela foi editada no final do ano passado e faz parte do chamado ajuste fiscal, que inclui ainda as MPs 664/14 e 668/15 e o Projeto de Lei 863/15.
"Fomos pegos de surpresa. Ficamos sabendo das medidas adotadas pela imprensa", disse o secretário de Administração e Finanças da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Quintino Severo. Tanto ele como outros sindicalistas que participaram do debate lembraram que o governo havia se comprometido, no ano passado, a não mexer em nenhum direito trabalhista sem antes ouvir as centrais.
O presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, disse que ficou "perplexo" por o governo "iniciar o processo de ajuste com a área mais vulnerável, que é a do trabalho". Segundo ele, as centrais estavam abertas ao diálogo e poderiam ter apresentado sugestões para melhorar o texto, evitando o desgaste político provocado pela edição da MP.
A falta de diálogo foi reconhecida até pelo relator da medida provisória, senador Paulo Rocha (PT-PA). "Foi um erro o governo não dialogar com os vários setores dos trabalhadores", afirmou Rocha.
'Fraudes mínimas'
Além da falta de diálogo, os representantes das centrais negaram que as fraudes sejam responsáveis pelo aumento dos gastos com o benefício, uma das alegações do Executivo para editar a MP.
O representante da CUT (Quintino Severo), que também preside o Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), disse que as "fraudes são mínimas" diante dos números do sistema e que já vêm sendo combatidas com a adoção de medidas administrativas, como a adoção da identificação biométrica nos saques do benefício.
O presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), Antônio Fernandes dos Santos Neto, disse que o aumento da fiscalização é a forma mais efetiva para combater tanto as fraudes como a rotatividade no mercado de trabalho, principal razão para o crescimento recorrente das concessões do seguro-desemprego no País. A rotatividade acontece quando há substituição de um empregado por outro no mesmo posto de trabalho.
Segundo ele, o déficit de auditores do trabalho chega a mil em todo o País, número que foi corroborado pela presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Rosa Maria. "O Ministério do Trabalho encontra-se sucateado", disse Santos Neto.
Ele disse ainda que apenas 6,2% das empresas foram responsáveis, em 2013, por quase 64% das demissões de trabalhadores que procuraram o seguro-desemprego. Para ele, bastaria que a fiscalização acompanhasse esse universo para apurar eventuais irregularidades na concessão do benefício.
Agenda diferente
Durante a audiência pública, os sindicalistas defenderam uma agenda diferente do governo, que passa pela instituição de novos impostos, principalmente sobre grandes fortunas, pela redução de gastos do próprio governo e pelo aumento da fiscalização.
O presidente da Força Sindical, Miguel Torres, propôs a criação de impostos sobre grandes fortunas, sobre lucros e dividendos, sobre a remessa de dividendos para o exterior e sobre aviões e embarcações de luxo.
Segundo ele, somente estas medidas poderiam gerar uma arrecadação de mais de R$ 37 bilhões, valor superior aos R$ 18 bilhões que o governo alega que vai economizar com as MPs 664 e 665. "O governo poderia arrecadar muito mais sem mexer em nenhum direito dos trabalhadores", disse Torres.
Os sindicalistas também alertaram para os setores que mais vão sofrer com as regras da MP 665, que seriam os jovens (a parcela de maior rotatividade do mercado de trabalho), comerciários, pescadores e agricultores rurais.
O representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Carlos Eduardo Silva, disse que a MP 665 exclui o acesso ao benefício de 70,2% dos trabalhadores rurais com carteira de trabalho. São pessoas contratadas por safra, com contratos inferiores há um ano.
De acordo com a norma, a partir de março, o trabalhador demitido deve comprovar 18 meses de carteira assinada – computados nos últimos dois anos – para receber o benefício. Antes eram exigidos seis meses ininterruptos. "Se antes havia uma dificuldade, agora certamente eles [agricultores] serão excluídos", disse Silva.
Opinião de especialistas
Expositores dizem que governo federal errou ao optar por medida provisória em vez de projeto de lei para mudar as regras sobre a concessão de pensão por morte.
Segundo os especialistas presentes na audiência pública, a medida adotada pela presidente Dilma Rousseff restringiu o diálogo nas Casas legislativas, já que o instrumento da medida provisória, que possui força de lei, produz efeitos imediatos, mesmo antes de sua aprovação pelo Congresso Nacional.
"O governo federal errou em três dimensões: falta de diálogo; por optar pela medida provisória em vez de um projeto de lei; e, por fim, pelo conteúdo da matéria", disse o diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz. "São medidas excessivas que traem, inclusive, as bases trabalhistas que sempre sustentaram o governo da presidente Dilma", afirmou Augusto de Queiroz.
Para o deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), o governo não respeitou os trabalhadores e nem o Congresso, já que não houve diálogo. "Irei trabalhar, incansavelmente, para derrubar essa matéria", afirmou Faria de Sá, que disse ainda que a "vaca não só tossiu como também foi para o brejo", fazendo referência à fala da presidente Dilma, que em campanha convocou uma mobilização nacional "nem que a vaca tussa", pelos direitos dos trabalhadores.
Corrigir distorções
Já o senador Donizeti Nogueira (PT-TO) acredita que a medida vem corrigir distorções. "Sou da base do governo e não vejo que a presidente entrou em contradição. Ela disse que iria corrigir as distorções e está fazendo. São ajustes necessários". "Não pactuo com a ideia de que a vaca tossiu e foi para o brejo".
O deputado Carlos Marun (PMDB-MS) disse que ainda não tem uma posição consolidada diante da proposta, mas observou: "No grande momento do programa Minha Casa Minha Vida não se encontrava pedreiro para tocar o programa, mas encontrava-se pelo interior do País milhares de pessoas gozando o seguro desemprego".
De acordo com o diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz, medidas que melhorem a gestão e qualidade da previdência são bem vindas. "Especificamente em relação à previdência, essas medidas devem fazer sentido em relação à estratégia geral do Estado", disse Ganz.
'Governo foi corajoso'
Para o representante do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcelo Caetano, a medida adotada pelo governo foi corajosa, mas disse que "não se simpatiza com a ideia da forma como foi adotada". "Fica claro que a medida faz parte do ajuste fiscal, mas o impacto de algumas propostas só será sentido em 2018, como, por exemplo, a pensão por morte. Por isso, considero que essa e outras medidas foram corajosas", ressaltou Caetano.
Marcelo Caetano observou ainda que o sistema brasileiro de pensões proporciona benefícios maiores que países com a relação Produto Interno Bruto (PIB) per capita três vezes superiores a do Brasil. "Na Alemanha – disse – se uma pessoa fica viúva até os 45 anos terá direito a dois anos de pensão. Na Suécia, se uma pessoa jovem fica viúva ela terá pensão por um período que lhe permita se inserir no mercado de trabalho. Aqui é vitalícia. E na , para se ter este direito, o tempo mínimo de contribuição é de 5 anos".
Pelas suas contas, mesmo que o Governo consiga aprovar as modificações propostas, seus efeitos financeiros para a Previdência só começarão a apresentar resultados em 2 018. O deputado Betinho (PSDB PE) assinalou: "Então por que esta pressa da medida provisória?"
Entenda as mudanças
Conforme a MP 664/14, desde março, o benefício pensão por morte só será concedido ao cônjuge que comprove, no mínimo, dois anos de casamento ou união estável. Antes não havia exigência de período mínimo de relacionamento.
A MP também altera regras do auxílio-doença. Entre outras mudanças, o texto estabelece que os primeiros 30 dias de licença médica serão pagos pelo empregador, em vez dos 15 dias até então em vigor.
Debate sobre previdência
A Câmara dos Deputados realiza nesta quarta-feira (8), às 9h30, uma sessão especial de debates (conhecida como comissão geral) para discutir a previdência social. O debate contará com a presença do ministro da Previdência, Carlos Eduardo Gabas.
Fonte: Agência Câmara
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