O Sindicato dos Bancários de Campinas, filiado à Feeb SP/MS, realizou nesta semana uma entrevista com a economista Vivian Machado, do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). Durante a entrevista, a técnica falou sobre os lucros dos quatro maiores bancos do país, os impactos da pandemia e o papel dos bancos neste período.
Leia na íntegra:
(Por Sindicato dos Bancários de Campinas)
A economista Vivian Machado, técnica do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), órgão de assessoria dos sindicatos de trabalhadores, em entrevista ao “O Bancário”, analisa os lucros dos quatro maiores bancos do país, os efeitos do aumento da PDD (Provisão de Devedores Duvidosos), os impactos da pandemia do novo coronavírus sobre o setor e o papel dos bancos durante a crise sanitária. Confira.
Vivian Machado, técnica do Dieese (foto: Luís Yamada)
O Bancário: Os quatros maiores bancos do país (Itaú, Bradesco, Santander e Banco do Brasil) lucraram R$ 66,1 bilhões em 2020. Mesmo com uma queda de 22,1% (média) em relação à 2019, o que explica essa lucratividade em plena pandemia do novo coronavírus?
Vivian Machado: As carteiras de crédito dos quatro bancos cresceram em média 14,3%, em 2020. A maior oferta de crédito, somada ao crescimento de suas bases de clientes, contribuíram para que, mesmo com a pandemia, os bancos auferissem ainda uma significativa receita da prestação de serviço e tarifas (os quatro juntos arrecadaram R$ 113,0 bilhões apenas com essas receitas secundárias). Dessa forma, podemos dizer que a queda do lucro não está vinculada a uma redução de atividade dos bancos, mas principalmente a efeitos contábeis, com a ampliação das provisões diante do cenário impreciso que se anunciou quando teve início a pandemia e a quarentena, com a interrupção da atividade econômica e algumas contas tendo sido muito afetadas pelo câmbio (uma forte desvalorização do real frente ao dólar). Ademais, os bancos seguem reduzindo despesas administrativas e de pessoal, o que contribuiu para o resultado positivo.
O Bancário: A provisão para os devedores duvidosos (PDD) foi de R$ 99,8 bilhões, aumento de 35,8% em relação a 2019. Era necessário elevar a reserva contra possíveis calotes?
Vivian Machado: Diante do tamanho da crise e da incerteza, esse é um comportamento natural e esperado dos bancos, especialmente os brasileiros, reconhecidos no mercado internacional por serem muito prudenciais. Todavia, ao longo do ano, a expectativa de alta na inadimplência que justificaram esse provisionamento extraordinário, não se confirmou e, com isso, os bancos foram corrigindo a PDD (as taxas de inadimplência nos quatro bancos variaram entre 1,9% e 2,3%, apenas). Por essa razão, já no segundo semestre os resultados foram maiores.
Esse provisionamento, como destacado anteriormente, foi um dos principais responsáveis pela queda dos lucros. Uma questão muito mais contábil do que operacional.
O Bancário: Como avalia o papel dos bancos visando atenuar a crise econômica e social provocada pela Covid-19? As linhas de crédito lançadas foram suficientes? Em tempos normais, por exemplo, as micro, pequenas e médias empresas enfrentam dificuldades para obter empréstimos no sistema bancário privado. Os bancos públicos tornam-se a única alternativa. Durante a pandemia, os bancos abriram suas portas e estabilizaram a economia do país?
Vivian Machado: Os bancos no Brasil são extremamente conservadores e sua atuação na crise atual se deu, principalmente, em função dos créditos direcionados (rurais e imobiliários) e dos programas emergenciais de crédito para as micro, pequenas e médias empresas que foram criados. Segundo o relatório de inflação do BCB, as operações de PEAC/FGI e Pronampe contribuíram para elevação de 16,7% do montante de crédito contratado pelas empresas no trimestre encerrado em outubro. Todavia, o desempenho dos bancos privados poderia ter sido melhor, pois, eles colocaram excessivas exigências de garantia, por não aceitarem assumir, sozinhos, os riscos de tais operações nesse momento tão delicado da economia nacional. Isso atrasou demais o acesso de grande parte das empresas a esses recursos.
O Bancário: Em nome da pandemia, os grandes bancos fecharam 1.375 agências e postos de atendimento, demitiram mais de 11.263 bancários e expandiram os canais digitais em 2020. Na contramão dos bancos, e com respaldo do BC (Banco Central), as cooperativas de crédito ampliaram a presença física em vários pontos do país. Ao mesmo tempo, 40 bancos digitais (fintechs) iniciaram suas operações. Quais foram os impactos dessas mudanças sobre os lucros no setor, no acesso ao sistema financeiro (bancarização) e no mundo do trabalho?
Vivian Machado: São muitos os novos participantes (entrando) no mercado financeiro e ganhando espaço, entre eles as cooperativas, as fintechs e as corretoras de investimento. Entretanto, os bancos, atentos a esse movimento, vem se reposicionando em relação a isso, adquirindo participação nessas empresas ou mesmo comprando corretoras e fintechs. Dessa maneira, esses novos integrantes, de alguma forma, entram na cadeia de valor dos grandes bancos, ajudando a impulsionar o resultado destes, muitas vezes, com base em trabalhadores não bancários (autônomos, PJ, trabalhadores de TI, entre outros). Quanto mais tecnológicos os bancos se tornam, menores ficam seus custos e despesas, porém, isso não se reflete em menores receitas de tarifas para seus clientes e os bancos seguem ganhando.
Quanto ao crescimento das cooperativas de crédito, de fato, o Banco Central já deixou claro que vem mudando suas regras visando incentivar a ampliação da participação dessas no mercado, na busca pela redução dos custos do crédito com a ampliação da concorrência. Os bancos se mostram bem preocupados com todas essas mudanças e é a partir disso que “justificam” toda a reestruturação que vem fazendo.
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